Grande e complicada seara essa a dos “livros” para colorir. Por mais que vendam a rodo, porque são cadernos de distração como tínhamos na infância (pelo menos eu tinha), são o que garantem o pro labore dos editores (para quem já começou a imprimi-los), como já foi a “maldição” dos best-sellers que roubam o cenário editorial internacional. Hoje só vendem livros “estrangeiros”, bem ou mal traduzidos, mas que não refletem o que se escreve e se publica em português legítimo. Eu vejo a lista dos 10 mais vendidos e choro.
A vida dos livros
Crônicas editoriais publicadas num primeiro volume chamado "A vida dos livros" (Ibis Libris, 2010), narrando as experiências como editora de jornal e livros desde 1978.
sábado, 17 de junho de 2023
Ainda sobre "livros" para colorir
domingo, 16 de maio de 2021
Sempre sobra para o editor
Realmente os tradutores deveriam traduzir e os revisores revisar, mas não é isso o que acontece. Sorte que o editor vem depois deles e pode terminar o serviço por eles, pelo menos eu posso. Nunca se deve pedir um serviço a alguém que não se possa fazer sozinho, a não ser serviços elétricos e cirurgias. Se mando fazerem uma comida, devo ser capaz de prepará-la também. Senão não poderei corrigir se sair errado. Acontece o mesmo com o livro. Tenho que ser capaz de fazê-lo como o autor, o revisor e o tradutor devem fazê-lo. Como o autor para compreender o que ele escreveu, respeitar e corrigir se necessário. Como o tradutor e revisor para retificá-los quando for preciso. Senão o editor acabará publicando o pior livro, que nem o autor, nem o revisor, nem o tradutor souberam fazer. Quando o livro é bom, elogiam o autor. Quando o livro é ruim, o editor é que não presta.
16 de maio de 2019
sexta-feira, 2 de abril de 2021
Michael & Eu
Michael Jackson sempre foi reconhecido como um excelente cantor e dançarino e também compositor. Criou momentos inesquecíveis com "Billy Jean", fazendo seu Moonwalk, ou reunindo amigos para cantar "We are the World", na década de 1980. Desde pequeno, marcou a nossa vida, até morrer, repentinamente, em 25 de junho de 2009, às vésperas da estreia do seu "This is it!", aos 50 anos de idade. Ninguém esperava (nem poderia esperar) por isso.
Um dia antes da morte de Michael Jackson, eu tinha lançado, no Rio, uma edição com uma nova tradução de "Carmina Burana", no dia de São João, na antiga Livraria Leonardo Da Vinci, no centro da cidade.
No mês seguinte, houve três apresentações gratuitas de "Carmina Burana", de Carl Orff, no teatro da Escola de Música da UFRJ, durante um fim de semana, e me convidaram a lançar o meu livro recém-lançado lá. Ali eu conheci Lilian Bosboom, casada com um americano, que era o técnico de luz, durante o espetáculo, lindíssimo, com coral e balé.
Em dezembro, ela me ligou dizendo que, em outubro, havia conhecido, durante uma peça de teatro, um DJ, Leandro Lapagesse, que fazia o som, que tinha ido ao enterro de Michael e estava escrevendo um livro sobre a influência do cantor na vida dele, e que iria se chamar "Michael & Eu" (como o livro "Marley & Eu", que traduzi em 2006, para a Ediouro). Quando soube que queria publicá-lo, Lilian se lembrou de mim, e resolveu me ligar para saber se eu poderia avaliar o texto e ver que tipo de revisão ele precisaria.
Depois dessa ligação, eu tive um sonho com Michael Jackson, em que eu estava em Neverland, em uma reunião, num átrio de chão quadriculado, com uma fonte no meio, e Michael dançava em volta, com o som de crianças brincando ao fundo, que estavam em outra sala. Ele deu uma volta completa e me olhava pelo canto dos olhos. Eu nem podia imaginar o que isso queria dizer.
Lilian ligou novamente marcando o encontro para janeiro de 2010 e eu lhe contei o sonho. Ela pensou que eu fosse maluca, mas não me disse nada.
Fui ao apartamento do Leo para conhecê-lo e ler o texto que queria publicar. Ao chegar, começamos a esperar pela Lilian, que participaria da reunião. Para me entreter, ele colocou um vídeo de um show no Japão, e enquanto não começava, tocavam o trecho inicial de "Carmina Burana". Eu perguntei ao Leo, por que estava tocando aquela música e ele me explicou que Michael usava "Carmina" para aquecer o público. Nesse momento, eu não me dei conta da coincidência. Eu conheci Lilian num espetáculo de "Carmina Burana". Este era o elo de ligação entre ela e Leo que iria me apresentar um livro sobre ele e o cantor.
Para fazer sala, Leo começou a me mostrar algumas peças de sua super coleção de objetos sobre Michael Jackson, que enchiam a casa. Entre bonecos, discos, pôsteres, ímãs, cartazes, Leo me mostrou dois livros: um era a autobiografia de Michael, escrita quando o cantor ainda era novo e outro, um livro de "Poemas e reflexões", chamado "Dancing the Dream", prefaciado por Elizabeth Taylor. Naquele instante, eu não fiz a associação de que era exatamente o que ele tinha feito: dançado no meu sonho. Mas, quando vi que o livro tinha poemas, eu disse: "Quer quanto que este livro está disponível?"
Leo se surpreendeu com o que eu disse, e respondeu: "Jura? Mas deve ser caro!" Eu disse: "Não, já se passaram sete meses da morte dele. Se ninguém publicou, é porque não sabem que o livro existe. E depois são poemas, quem é que sabe traduzir poesia? As grandes editoras não fazem isso. Custa o mesmo preço de qualquer livro que ninguém quer: mil dólares".
Ele achou pouco e disse: "Mil dólares? Se for isso, eu quero fazer parte disso também". Eu procurei o nome da editora no livro, anotei, descobri o email e entrei em contato com uma das maiores editoras americanas, que detinha os direitos autorais de Michael Jackson.
A resposta à minha oferta de mil dólares foi quase cômica: "Você quer ESTE livro?" Eu disse: "Sim, ele está disponível, não está?" Ele respondeu: "Você me dá duas semanas para responder?" Respondi: "Sim, mas não se esqueça que fui eu quem pediu primeiro". Dois dias depois, ele retornou com uma contraproposta: "Mil e quinhentos dólares". Eu disse: "Fechado". E assinamos o contrato. Detalhe: foi a primeira tradução desse livro no mundo. Até então, ninguém tinha comprado os direitos de tradução de "Dancing the Dream".
Leo não cabia em si de contente. Ele iria dividir comigo o direito de publicar o livro de Michael Jackson no Brasil e arcar com metade dos custos, inclusive da impressão de 1.000 exemplares. Era o começo de uma saga que só concretizamos no lançamento do livro, no aniversário de Michael, em 29 de agosto de 2011, na Livraria Saraiva, com a presença de atores globais lendo trechos do livro, um conto, uma fábula, um poema, uma história, um depoimento.
Eu levei sete meses traduzindo, entre fevereiro e setembro de 2010. Em agosto, fizemos a festa de 10 anos da Ibis Libris, comemorando a compra dos direitos autorais de tradução e publicação de "A dança dos sonhos", nome que escolhi para o livro, com a presença de Nikki Goulart, cover de Michael Jackson.
Na verdade, eu fui à casa de Leo para descobrir o livro de Michael que ninguém conhecia, só os muito fãs e aficionados por Jacko. Enquanto eu traduzia (isso virou notícia muito rápido, porque eu tinha furado todo mundo), me perguntavam se ele escrevia bem. Se ele sabia fazer tudo muito bem, por que ele não escreveria bem? Eu respondia que as pessoas iriam se surpreender com o que ele escreveu. (Uma das histórias que mais gosto é "O peixe que sentia sede". Foi muito divertido traduzi-lo. Sim, ele escreveu o livro muito bem.)
Recebi propostas de várias editoras tentando comprar o texto para publicá-lo. A Revista Caras me ofereceu R$ 1 milhão para fazer a sua edição como brinde para os assinantes para 1 milhão de exemplares. Eliana dos dedinhos também queria fazer o livro. Só que eu tinha que fazer a minha edição de qualquer jeito. Ninguém me pediu para ver o texto traduzido, viram apenas o livro original. E provavelmente por não entenderem nada de poesia nem de Michael Jackson, quem levou a proposta não soube defendê-la. E eu e Leo fizemos a nossa edição sozinhos.
O livro vendeu e se pagou. Mas não houve lucro de R$ 1 milhão. Para isso, teríamos que imprimir muito mais. Naquela época, dois anos depois da morte de Jacko, teria sido um sucesso muito maior se uma grande editora tivesse investido no livro. Porém, coube a mim, uma pequena editora traduzi-lo e publicá-lo.
Até hoje se surpreendem de que Michael tivesse escrito e publicado um livro, lançado no programa da Oprah Winfrey. No entanto, pouco depois do lançamento, veio o primeiro escândalo com as crianças. O livro foi boicotado pela imprensa. Por isso caiu no esquecimento. Fizeram uma nova impressão em Londres após a morte dele. Mas no Brasil muita gente ainda não sabe que ele escreveu esse livro e nem que foi traduzido e publicado aqui. A imprensa aqui também não divulgou mais, quando poderia.
Há alguns anos, fui entrevistada pelo Claufe Rodrigues para o programa Globonews Literatura, e ele me perguntou qual tinha sido um grande momento da minha pequena editora. Eu disse: lançar o livro de Michael Jackson. Foi uma empreitada de gente grande, num momento em que o dólar estava a R$ 1,50. Isso tornou possível o meu sonho de publicar Michael Jackson se tornar realidade.
No fundo, eu senti que Michael me escolheu, a dedo, para traduzir o livro dele, pois além do sonho que tive, houve uma sucessão de fatos e coincidências que me levou até o livro. Depois, Leo Lapagesse estreou sua peça "Michael e eu", com Nikki Goulart. As pessoas iam às lágrimas, porque ele personifica Michael tão bem, que você jura que está diante do próprio Michael Jackson.
Na festa de aniversário de 10 anos da editora, eu tive meu momento de "Michael e eu" ao lado de Nikki Goulart. Foi um lindo aniversário, no 00, na Gávea, no dia 18 de agosto de 2010. A peça, por coincidência, estreou, dois anos depois, no Teatro do Leblon, em 17 de agosto de 2012.
2/04/2021 - 22h20
sábado, 26 de setembro de 2020
Fazer livros não é para os fracos
Um livro não é só seu autor e não é só a edição. Ambos devem estar conjugados da melhor maneira para o resultado ser bom. Eu não entendo um livro só gráfico, sem conteúdo. E não entendo um livro bem escrito e mal editado. Dá dó só de olhar. Há projetos gráficos que se superam, mas percebo que dão mais importância a isso do que para o livro em si, em alguns casos. Não sabem o trabalho que deu para o texto ser terminado. Quanto durou a revisão, o que entrou em questão até a redação final do livro. Veem só pelo lado de fora.
Uma vez chamei a atenção do meu designer que estava junto no lançamento, para quanto o livro estava sendo elogiado por fora. Eu comparei à construção de uma casa, em que só elogiam o exterior. Por trás da tinta da parede, há muitos tijolos e cimento. Muitos canos e ligações elétricas. Toda uma engenharia para fazer a casa funcionar desde a sua fundação. Como filha de arquiteta, e irmã de engenheiro, entendo bem de construções. Mas aplico isso aos livros, como ele é tecido, urdido por dentro. Só quem o faz sabe quanto ele significa. Como ele foi feito. Como foi concebido e finalmente produzido. O livro fica lindo por fora, mas por dentro, tem que estar igualmente belo, bem diagramado, bem escrito, bem revisado, senão todo o trabalho se perde.
Fazer um livro feio custa o mesmo que fazer um livro bonito. Mas um livro caro não quer dizer que vá ficar lindo. A qualidade não está só no papel e na tinta (mas até esses têm que ser bons também). Está na criação desse livro como algo individual. E aí passamos à transcendência. O livro sabe o que quer. Como ser existente, também pensa e sabe e se faz compreender. Quem lida com livros, descobre que eles têm sua forma de se comunicar, de dizer o que querem. Tenho um sem-número de histórias nesse sentido. Fazer livros não é para os fracos. Ou como diria o avô de um editor que conheço, fazer livros é para profissionais.
Rio de Janeiro, 26 de setembro de 2020 - 15h07
quarta-feira, 5 de agosto de 2020
O mistério do erro que volta
sábado, 14 de março de 2020
A correção dos erros
quinta-feira, 1 de agosto de 2019
A história de "Ulysses" é uma odisseia
a história é engraçada: "Ulysses", como todo mundo sabe, era proibido na Inglaterra e nos EUA, com queima de exemplares, multas, confiscos de edições piratas etc. - mas era liberado na frança, onde saiu em 1922.
[vá lá que teve a sorte de que a ação caiu nas mãos de um juiz bastante, digamos, liberal, e que até ficou famoso por conta disso].