domingo, 20 de novembro de 2011

12 Mandamentos do Editor

  • 1. Desconfie do autor. Ele pode estar errado.
    2. Não acredite na revisão dos outros. A revisão final é direito do editor.
    3. Enquanto o texto não está pronto, o livro não sai.
    4. Se confiar demais no autor, o editor erra junto.
    5. Não admita, em hipótese alguma, que o autor o apresse.
    6. Convença o autor a escolher um bom título. 
    7. Brigue, se necessário, pela boa gramática e o vocabulário. 
    8. Não aceite soluções baratas, só para não "sair caro". Em geral, é ao contrário que acontece.
    9. O livro é permanente, o autor não. O conhecimento é sempre maior que o mestre. O livro vale o sacrifício.
    10. Faça todo o possível para evitar enganos. Normalmente, o livro tem a paciência de esperar até que se enxerguem todos os erros.
    11. A gráfica tem que estar afinada com o editor. Senão acontece um desastre. Ou vários.
    12. Tenha paciência com o autor, se ele não souber como fazer um livro. Essa sabedoria renderá bons frutos no futuro.

    1/11/2011 

    Conselhos para quem quer escrever melhor

    Gramática e ortografia dependem de uma constante vigilância. É fácil errar, as palavras mudam, ora se escrevem de um jeito e ora de outro. Dicionário se torna jurássico. Ontem encontrei uma Bíblia com ortografia antiga, mas a tradução é ótima. Eu trabalho em dois níveis, dos termos e do sentido. Há sempre uma forma melhor de dizer alguma coisa

    É meu trabalho corrigir, revisar e ajustar as frases. Assim se torna mais fácil perceber os erros. Eu leio qualquer texto procurando erros. É deformação do ofício. Mas o melhor modo de aprender a escrever é ler bons livros (não más traduções, nem más revisões) da nossa literatura brasileira, de Clarice a Machado de Assis, de Cecília Meireles a Carlos Drummond de Andrade, só para mencionar os mais famosos, mas há muito, muito, muito que ler.

    Se for ler uma tradução, leia uma que seja boa, de preferências as antigas, que eram feitas por grandes escritores, como Monteiro Lobato e Manuel Bandeira. As traduções novas sofrem de literalidade, ou seja, são traduzidos de forma direta, sem a elaboração do português, por isso ler textos bem escritos em português (não traduzidos) é essencial, senão escolha um bom tradutor contemporâneo.

    Leia Lygia Fagundes Telles, Patrícia Melo, Livia Garcia-Roza, Adélia Prado, e mais um tanto de mulheres que são grandes autoras, fora os homens que estão por toda a parte. Pesquise numa livraria, mesmo que seja virtual, o que você pode ler. Leitura é um hábito como outro qualquer, tem que ser instalado e mantido. Se deixarmos para lá, ele não vinga.

    Quando voltei a ler assiduamente, depois que nasceu a caçula, me forcei à leitura, colocando um livro em cada lugar onde me sentava. Mas escolhia livros que queria ler. Foi assim que reinstalei o hábito da leitura: espalhei vários livros pela casa, onde pudesse pegá-los sem esforço e toda vez lá estavam eles esperando por mim. Eu lia qualquer coisa, uma frase, um poema, um parágrafo, uma página, e isso me estimulava a ler mais, e eu ia lendo até terminar o livro, senão, o que li havia sido o suficiente.

    Isso ajuda a consertar nosso português, uma língua tão difícil, que pouquíssimos falam. Não é tão falada quanto o espanhol e mal consegue abrir espaço na ONU. Mas é reconhecida como uma das línguas fundamentais na criação de obras literárias. Os brasilianistas e lusófonos que o digam.

    A beleza do português só pode ser vista de longe, ou quando a traduzimos. Faço traduções para o inglês e vice-versa, mas colocar em português qualquer coisa bem traduzida é uma arte, para manter o significado usando nossas palavras e parecer bem escrito.

    Como disse Mario Quintana, "Escreva, escreva, escreva, e me volte daqui a vinte anos".

    13/11/2010 - 14h34

    sexta-feira, 9 de setembro de 2011

    A vida dos livros em pílulas

    1.
    A melhor coisa de ser editor é aprender como fazer cada livro de um jeito.
    2.
    Sempre que um livro se demora, eu me pergunto se não há mais um erro escondido. Encontrei-o: na orelha, faltava uma sílaba numa palavra na penúltima linha da biografia: "numa vida dedicaDA..." Nem me surpreendi.
    3.
    É preciso olhar atentamente o livro, devagar, para que o erro se mostre. Nem sempre o olho percebe o que está claro. O simples parece muito óbvio e é justamente onde não esperamos que o errinho se aloja.
    4.
    Vender livros é uma atividade personalíssima. 
    5.
    Ter nas mãos um pequeno livro que se fez é tornar palpável o infinito. 
    6.
    Semear livros é uma atribuição do editor. O autor escreve, o editor publica. Há uma linha bem tênue entre essas duas figuras. Mas o autor que se publica é um editor de si mesmo.
    7.
    A demora de um livro em sair é sempre sinal de que ele não está pronto, por mais que pensemos que esteja completo. Se ele demora, é porque não está terminado, mesmo que aparentemente esteja todo "visto".
    8.
    Há várias formas de dizer a mesma coisa, mas sempre há uma melhor. É esse aperfeiçoamento que o livro espera de nós.
    9.
    Não se colocam livros em lugares desconhecidos. Isso é muito raro. Principalmente livros de poesia.
    10.
    Não há dois livros iguais, por mais semelhantes que sejam. Cada um é um, como as digitais.
     

    quinta-feira, 23 de junho de 2011

    O livro-bebê

    Meu amigo Pedro Lage está fazendo um novo livro e está em processo de revisão final dos poemas. Depois de algumas idas e vindas, e muitos meses de espera, finalmente me mandou um arquivo que revisei e devolvi depois de ajustar as formatações que ele me pedia. Gastei a tarde toda de segunda-feira para arrumar os poemas, limpando o fundo das páginas, como se diz, aquelas marcações que só aparecem quando clicamos o P de parágrafo do Word. Mandei um pdf para que visualizasse o texto, e visse onde eu havia feito correções, acreditando (como sempre acredito) que fosse o texto final. Mas... como sempre acontece, Pedro resolveu mexer mais um pouco nos poemas, mudando-os de lugar, reescrevendo alguns versos, alterando de toda forma o arquivo que eu lhe mandara, porém... ele fez todas as alterações no outro arquivo, acreditando que não precisasse senão acrescentar as alterações que eu havia assinalado. Mas o que não aparecia eram as formatações e limpezas que eu havia feito no arquivo que lhe mandei em seguida para que fizesse suas alterações. Ele não tem culpa de não comprender esse processo sempre extenso de revisão de um livro e o trabalho que o editor tem de limpar o original (digital) das impurezas do branco.

    O que ele não esperava é que, ao remeter o arquivo em Word para mim às 2h da manhã, eu acordasse às 4h30 e, ao procurar ver que horas eram, descobrisse no meu BlackBerry o email que ele acabara de mandar, com todas as alterações no outro arquivo e não no que eu havia enviado! Perdi imediatamente o sono e me levantei, indo para a sala ligar o computador... Mas o que ele estava pensando? Que meu trabalho pode ser jogado fora? Inconformada, abri o arquivo com todas as mudanças e supostas correções que ele havia acatado da minha revisão e descobri, pasma, que não só eu precisava refazer toda a formatação dos poemas, como recorrigir tudo o que ele havia "saltado", e ainda descobri outros erros que haviam me escapado, porque, claro, não se encontram todos os erros em uma só revisão.

    O que aconteceu é típico, acontece toda vez, mas o que foi inédito foi eu ser literalmente "acordada" pelo livro no meio da noite, como um bebê que chora, infeliz, por estar com cólica ou dor de ouvido. E eu, como mãe diligente, pus-me de pé para acudi-lo. E não estava, o coitadinho, todo bagunçado de novo?

    Respondi uns três emails ao Pedro, falando o que acontecera e porque ele deveria ter usado o meu arquivo e não o dele. E comecei dizendo: "Quando um autor me diz que não preciso reler um texto, é justamente aí que preciso". O excesso de zelo como editora me leva a esses extremos: acordar de madrugada só porque um livro me chama: "Revise-me!" Pode?

    Assim, descobri que como tudo, existe o livro-bebê, que chora enquanto está sendo feito, e ao se ver molhado no berço, berra até acordar sua ama, que, desprendida e despreocupada, vai ao seu encontro, para relê-lo, com todo amor e carinho, porque dali sairá um livro pronto. Mas enquanto ainda não é, ele esperneia pedindo atenção.

    Ao explicar a Pedro que eu havia levantado às 4h30 para revisar o livro, ele riu, compreendendo, que, como um filho, o livro pede atenção de quem cuida dele a qualquer momento, não importa a hora, e que isso é mais forte do que nós. Ele achou graça, mas me conhecendo, percebeu que, naquele momento, estávamos fazendo algo muito importante, que pode não parecer nada diante de outras coisas, mas em si mesmo, é tudo.

    Rio de Janeiro, 23 de junho de 2011 - 23h12

    sexta-feira, 20 de maio de 2011

    O dia a dia dos livros

    Vivemos à volta de livros que vivem em torno de nós. Olhamos para paredes forradas de volumes, bibliotecas extensas até onde alcançam os olhos. Os livros enchem as casas, como preenchem as livrarias, todos olhando de seu canto da estante, esperando mãos ávidas para buscá-los. Uma vitrine de livros é uma janela viva. Os volumes respiram, como nós. E sorriem lentamente em sua imobilidade.

    Mas há os livros rápidos, os que carregamos na bolsa, na pasta, na sacola, para ler na fila do banco, no recreio, no metrô, no ônibus, na sala de espera. Ali os médicos deveriam oferecer livros e não revistas. No cabeleireiro, a conversa seria outra, se as madames lessem os clássicos. E os homens também, na barbearia.

    Há os livros que lemos sem contar a ninguém. E aqueles que contamos para todo mundo. O melhor livro é o emprestado, nunca o que emprestamos. Ele nunca volta como foi, e talvez nunca volte. Mas quem o empresta, dá ao amigo um tesouro.

    Bibliotecários são guardiões de livros. Entendem deles como um paciente. Auscultam páginas e observam suas marcas. Um livro de biblioteca é diferente de qualquer outro. É um ancião esperando uma visita.

    Livros, enquanto existirem para o tato, serão o melhor companheiro de todas as horas. Escolhemos um livro como um amigo com quem passar o tempo. E com ele dialogamos. Perguntamos e ele responde, até o que não foi perguntado.

    Procuramos por certos livros a vida inteira, ou pensamos em um para escrever por muitos anos e, finalmente, ele se materializa, como por encanto, à nossa frente, ou descobrimos como fazê-lo.

    Convivo com livros há muito tempo, e partilho-os com meus amigos, ora dando-os, ora fazendo-os, ora lendo para eles. Quem lê para alguém, lê para si mesmo em voz alta. Palavras foram feitas para serem ouvidas, não só lidas.

    Livros partilham pensamentos, semeiam ideias em desconhecidos, que se tornam íntimos de seu autor. Ler tudo o que um autor escreve é ser mais que fã. Torna-se seu arauto. Em quantas mentes habitam os mesmos livros, cada um compreendido com sua ótica?

    Crianças amam os livros, não só por causa dos desenhos, mas porque contêm histórias que não estão em lugar algum - só ali se encontram os personagens daquele sonho. A ficção se transveste de realidade para nos fazer crer naquilo que acredita. Às vezes, uma história inventada é mais vívida do que a vivida.

    Os livros vivem seu dia a dia lado a lado com os homens, mulheres e crianças que se dispõem a lê-los, ou a esperar que algum deles o eleja, seja um exemplar, ou um e-book. O livro está prestes a se tornar uma lenda - em 500 anos de história, transformou-se na fala viva dos homens, não só as palavras escritas há muito tempo. É possível ler qualquer coisa assim que tenha sido escrita.

    A internet é um grande livro desorganizado, em que cada um dos milhões de internautas escreve nas páginas abertas da web. Uma fração disso se confina entre duas capas. O restante vive a trafegar nas telas de todos os computadores.

    Eis o novo livro: um ser eletrônico que se transmite, como pássaro mensageiro, em muitas línguas. Somos testemunhas dessa mudança, o que transformará o homem em leitor cibernauta, escrevendo sua história, minuto a minuto.

    Ler e escrever continua na ordem do dia. E aprendemos isso com os livros.

    Rio de Janeiro, 20 de maio de 2011 - 2h34

    Calendário maia

    terça-feira, 19 de abril de 2011

    Amanhã, os novos livros

    Há um princípio que rege os livros, e este é a permanência. Por mais que tentemos nos eternizar em nossos gestos e ações, apenas as palavras captarão toda a essência do que somos. Nelas restará dito o que pensamos, em última instância. E não basta dizê-las, temos de escrevê-las, grafá-las do melhor modo, editá-las e, finalmente, publicá-las.

    Essa publicação que nos vem à mente e depois às mãos, segue um ritual prévio, que se inicia muito antes de tentar visualizá-lo como coisa concreta. Um livro é toda uma ideia concebida num estalo, a percepção de se poder dizer algo de modo específico e único e, através de nossas palavras, capturar o espírito de tudo o que mais nos importa.

    Isso pode ser dito em um poema, em um conto ou romance, ou mesmo numa tese, numa carta, num ensaio. A palavra tem esse dom de perpetuidade, que toda vez ao ser pronunciada, traduzida, ou interpretada, pode suscitar várias reações, de perplexidade ou de compreensão. As ideias viajam nas palavras. E dizê-las faz toda a diferença.

    Escrever é esse ofício de labutar com palavras - e a força que elas contêm é maior e melhor do que todo o esforço humano de fazer qualquer outra coisa. As outras coisas são feitas, é claro, mas foi uma palavra, um verso, um texto que as motivou. Colombo atravessou o Oceano Atlântico por causa do livro de Marco Polo. O "Romance da Rosa" foi escrito por causa das cartas entre Abelardo e Heloísa, e sempre um livro puxou outro, por causa de um poema, outro foi escrito, por causa de um romance, outro romancista se debruçou sobre sua própria obra. Machado de Assis foi um tipógrafo quando jovem e começou a ler o que lhe davam. E esse mesmo labor tornou-o escritor de seus próprios pensamentos.

    Hoje, não é diferente. Os livros tomam forma, pois para cada pessoa, há um sentido no que escreve, como para o músico, só a música o protege, e para o pintor, as tintas respondem ao seu movimento. O escritor não é diferente de qualquer artista, e para o seu ofício basta escrever em qualquer lugar, num caderno ou laptop, numa folha de papel solta, num bloco encontrado ao acaso.

    Para mim, todo livro se apresenta como desafio de projetá-lo para o futuro. Seja a moça que queira publicar os primeiros poemas, ou o cavalheiro, as suas memórias, o livro é o elo entre o aqui e o agora e o amanhã.

    Rio de Janeiro, 19 de abril de 2011 - 23h32 - Dia de Santo Expedito