Meu amigo Pedro Lage está fazendo um novo livro e está em processo de revisão final dos poemas. Depois de algumas idas e vindas, e muitos meses de espera, finalmente me mandou um arquivo que revisei e devolvi depois de ajustar as formatações que ele me pedia. Gastei a tarde toda de segunda-feira para arrumar os poemas, limpando o fundo das páginas, como se diz, aquelas marcações que só aparecem quando clicamos o P de parágrafo do Word. Mandei um pdf para que visualizasse o texto, e visse onde eu havia feito correções, acreditando (como sempre acredito) que fosse o texto final. Mas... como sempre acontece, Pedro resolveu mexer mais um pouco nos poemas, mudando-os de lugar, reescrevendo alguns versos, alterando de toda forma o arquivo que eu lhe mandara, porém... ele fez todas as alterações no outro arquivo, acreditando que não precisasse senão acrescentar as alterações que eu havia assinalado. Mas o que não aparecia eram as formatações e limpezas que eu havia feito no arquivo que lhe mandei em seguida para que fizesse suas alterações. Ele não tem culpa de não comprender esse processo sempre extenso de revisão de um livro e o trabalho que o editor tem de limpar o original (digital) das impurezas do branco.
O que ele não esperava é que, ao remeter o arquivo em Word para mim às 2h da manhã, eu acordasse às 4h30 e, ao procurar ver que horas eram, descobrisse no meu BlackBerry o email que ele acabara de mandar, com todas as alterações no outro arquivo e não no que eu havia enviado! Perdi imediatamente o sono e me levantei, indo para a sala ligar o computador... Mas o que ele estava pensando? Que meu trabalho pode ser jogado fora? Inconformada, abri o arquivo com todas as mudanças e supostas correções que ele havia acatado da minha revisão e descobri, pasma, que não só eu precisava refazer toda a formatação dos poemas, como recorrigir tudo o que ele havia "saltado", e ainda descobri outros erros que haviam me escapado, porque, claro, não se encontram todos os erros em uma só revisão.
O que aconteceu é típico, acontece toda vez, mas o que foi inédito foi eu ser literalmente "acordada" pelo livro no meio da noite, como um bebê que chora, infeliz, por estar com cólica ou dor de ouvido. E eu, como mãe diligente, pus-me de pé para acudi-lo. E não estava, o coitadinho, todo bagunçado de novo?
Respondi uns três emails ao Pedro, falando o que acontecera e porque ele deveria ter usado o meu arquivo e não o dele. E comecei dizendo: "Quando um autor me diz que não preciso reler um texto, é justamente aí que preciso". O excesso de zelo como editora me leva a esses extremos: acordar de madrugada só porque um livro me chama: "Revise-me!" Pode?
Assim, descobri que como tudo, existe o livro-bebê, que chora enquanto está sendo feito, e ao se ver molhado no berço, berra até acordar sua ama, que, desprendida e despreocupada, vai ao seu encontro, para relê-lo, com todo amor e carinho, porque dali sairá um livro pronto. Mas enquanto ainda não é, ele esperneia pedindo atenção.
Ao explicar a Pedro que eu havia levantado às 4h30 para revisar o livro, ele riu, compreendendo, que, como um filho, o livro pede atenção de quem cuida dele a qualquer momento, não importa a hora, e que isso é mais forte do que nós. Ele achou graça, mas me conhecendo, percebeu que, naquele momento, estávamos fazendo algo muito importante, que pode não parecer nada diante de outras coisas, mas em si mesmo, é tudo.
Rio de Janeiro, 23 de junho de 2011 - 23h12