segunda-feira, 26 de março de 2018

Atenção ao vocativo

Noto, com constante insistência, que as pessoas esquecem, ou não sabem o que é o vocativo numa frase. O vocativo é assinalado com uma vírgula após o nome a quem se dirige a frase, ou após a frase, antes do nome a quem ela é dirigida. "Pai, venha cá", "Bom dia, amor", "Querida, encolhi as crianças". No Facebook, caiu em desuso. Desuso por esquecimento da regra. E noto o mesmo em todos os livros que recebo para publicação, seja de poesia, conto ou romance. "Deus, por que me abandonaste?" Revisores deixam escapar. Autores negligenciam a regra. No dia a dia, não se põe a vírgula do vocativo onde é devida. A pontuação, em geral, é desleixada. Ouço até me dizerem que não gostam de vírgulas. Bom, não gostam de nenhum sinal de pontuação, pois esquecem do ponto de interrogação numa pergunta e o de exclamação numa resposta com ênfase. Confundem dois pontos com ponto e vírgula e não sabem construir diálogos com travessões, colocando aspas quando esta é uma regra de ortografia do inglês. Vejo traduções serem feitas assim, com diálogos entre aspas. E os desavisados usam tudo: aspas, travessões e itálico, quando somente um deles basta. Mas a minha questão aqui é o vocativo. Não se esqueçam de indicá-lo, amigos!
22/03/2015 - 14h17


domingo, 25 de março de 2018

A gente paga para vender

O autor está numa das pontas da cadeia do livro. Entre ele e o leitor, existem vários estágios por onde o livro passa, e cada um leva uma parte. Do autor ao preço final do livro na livraria, existem vários percalços, mas nem todos sabem disso. Pensam que o livro chega automaticamente nas livrarias, como se tivesse pezinhos ou asinhas. O autor escreve o livro e aí começa o périplo: vai para o revisor, o diagramador, a gráfica, o distribuidor, a livraria e finalmente o leitor. Se não der problema em nenhuma dessas etapas (até mesmo o leitor), a missão está cumprida e o editor fica feliz, mas não mais rico por causa disso, e evidentemente que o autor também não. A gente paga para vender.

25/03/2018 - 13h15


domingo, 11 de março de 2018

Minha mão contém palavras que não escrevo


Com este título iniciei o primeiro poema do livro que escrevi a quatro mãos com o poeta Álvaro Alves de Faria, em 8 de junho de 2016, depois de termos nos “reencontrado” pelo Twitter. Ele me propôs que escrevêssemos em sequência 22 poemas cada um, intercalados, um em resposta ao outro, e o tema seria a poesia e os poetas, portanto, metapoema, daí o primeiro verso que escrevi. O 44º poema foi escrito pelo Álvaro em 28 de julho de 2016, ou seja, um mês e vinte dias depois.

O que me surpreendeu foi que fiz poemas diferentes do que estava habituada a escrever e ele, por sua vez, foi acompanhando, ora seguindo, ora orientando para onde estávamos indo. O processo foi rápido, mas o resultado foi surpreendente. Eu não esperava ter escrito o que escrevi, a começar pelo primeiro poema, que deu título ao livro (claro que ele me deixou começar por cavalheirismo).

Durante quase um mês e meio, ele também era pego de surpresa pelos poemas que eu escrevia e me perguntava se eu estava chateada com ele. Claro que não. Mas a comunicação por e-mail pode ser muito falha e houve alguns mal-entendidos.

Depois que os poemas ficaram prontos, comecei a preparar a edição, sempre prometendo que logo ficaria pronto, o que não consegui. O ano de 2017 foi muito árduo, praticamente sem dinheiro para fazer nada. De 40 livros anuais dois anos antes, fiz somente dez, o que é uma catástrofe em termos de receita da editora. Mas consegui, por esforço hercúleo, imprimir alguns exemplares no meio do ano, que mandei para Álvaro, mas não consegui ir a São Paulo para lançá-lo. Fui para a Bienal, mas não lançamos o livro como havíamos planejado.

No começo de 2018, Álvaro se queixou dizendo que o tempo do livro tinha passado, que não cabia mais lançá-lo. Mas sequer tinha sido lançado ainda, respondi. A ansiedade fez com que ele se cansasse de esperá-lo. Fiquei triste de não poder atendê-lo, mas disse que eu acreditava que, ao contrário, o tempo do livro ainda não tinha chegado, que tinha ficado lindo, bem editado, etc., e que em alguma hora iríamos conseguir lançá-lo e ele me disse que faria o que eu dissesse. Apesar disso, anunciei o título na loja virtual da editora, apenas para constar, mas não acreditava que alguém fosse comprá-lo. Os poucos exemplares que fiz acabaram logo (imagine) e, os demais, mandei para Álvaro levar para Portugal e Espanha no final do ano.

Qual não foi minha surpresa quando, em 11 de fevereiro, pouco depois de Álvaro fazer sua queixa sobre a falta de lançamento, recebi um pedido de compra de um exemplar de uma moça que eu não conhecia: Mariangela Bazbuz, a quem tive de explicar que o livro estava sendo reimpresso, mas que eu estava esperando encontrar um bom preço por ele (na verdade, eu arrisquei, nem sabia como ela iria reagir), e perguntei, candidamente, por que tinha se interessado por ele. Aí ela me explicou que lia há tempos meus poemas e que tinha achado o título interessante, por dizer algo sobre o momento que ela estava passando. Por causa disso, seguiu-se uma série de emails até o início de março, quando eu já tinha conseguido um preço excelente para reimprimir o livro em seis dias úteis! Ela se surpreendeu de a própria autora responder ao e-mail, além de ser a editora do livro. Contou um pouco sobre ela, como tinha se aproximado da literatura e formado um grupo de leitura de textos de Clarice Lispector em Niterói! Tudo em literatura conspira.

Agora o que ela não esperava: por causa do pedido dela, o livro vai finalmente nascer. Recebi a notícia de que ficou pronto anteontem e saiu de São Paulo na sexta-feira e vai chegar aqui amanhã. Incrível como a vontade dela de ter o livro fez com que ele ressurgisse. Chegou a hora de entregá-lo a Mari. Eu vou poder confirmar para Álvaro que o tempo do livro realmente ainda não havia chegado, e que, como sempre, é preciso esperar pelo tempo do livro. “Minha mão contém palavras que não escrevo” nasceu agora.

11/03/2018 – 9h36 – Dia em que escolhi o nome da editora, em 2000, a partir do apelido de Fernando Pessoa, Íbis, como ele se assinava nas cartas a Ophélia, a Íbis-bebê, e por sua imagem estar encravada no Pão de Açúcar, segundo a lenda, desde 1500 a.C, quando os fenícios estiveram aqui. A editora foi lançada em 18 de agosto de 2000, no Museu da República, com o primeiro livro de Ricardo Ruiz, Poesia Profana.


sábado, 10 de março de 2018

Editora há 40 anos

Em 1978, eu me tornei editora do Jornal Análise do DCE da Universidade Mackenzie por WO, porque todos que faziam parte da redação até o ano anterior se formaram e saíram, então, como só fiquei eu, que em 77 era caloura, assumi interina e definitivamente a editoria, passando a publicar poemas e matérias pertinentes ao campus. E ali fiquei até 1980, quando fundei o Grupo Poeco-Só Poesia, reunindo os poetas mackenzistas e fazendo o Concurso Mackenzie de Poesia, de âmbito nacional, entre outras atividades literárias. Assim estou comemorando 40 anos que me tornei editora por vontade própria e mal sabia eu que era minha vocação, que depois se tornaria minha profissão. Já perdi a conta de quantos livros fiz no Poeco, para mim e para os outros, e durante a longa carreira de editora e livreira (já tive duas livrarias, uma em SP e outra no RJ), que se sedimentou depois que voltei para o Rio em 1999. Em agosto de 2000, lancei Poesia profana de Ricardo Ruiz, que pensei que seria o único livro da Ibis Libris, mas não foi. Coordenei o Ponte de Versos por 15 anos, lancei 4 antologias do movimento poético do Rio e a editora já tem mais de 400 títulos publicados. Tudo porque resolvi ajudar um amigo a publicar seu primeiro livro de poesia. Eu já fazia os meus, mas isso não queria dizer que eu fosse aceitar a empreitada como trabalho contínuo. Só que publicar é muito mais do que fazer livros. É mudar de atitude, é mudar a vida de pessoas, é alterar para sempre a face da terra com mais um livro (quem pensa que não, lembre-se de livros como "O Príncipe" ou "A Divina Comédia" escritos por exilados e renegados em sua terra). Publicar livros muda para sempre o status quo. Não só pelo esforço de fazê-lo, mas por todas as consequências por causa de sua existência. Comemoro feliz esses 40 anos, porque algo que comecei naturalmente tornou-se minha identidade, e que descobri que faço melhor do que qualquer outra coisa.

10/03/2018 - 12h20


"Como vai a editora?"

Em meio à produção intensa de livros, dou-me conta que não sabem o que estou fazendo, mas sempre me perguntam: "Como vai a editora?" ou "Tem escrito muito?". Eu não tenho escrito ultimamente, mas tenho cinco livros inéditos prontos, duas traduções terminadas, fora os livros da Ibis Libris que não são meus, mas é como se fossem. Tem os meus-meus e os meus-deles, porque ao fazer um livro para alguém torna-se meu enquanto estou fazendo, depois solto-o no mundo e seja o que Deus quiser. Quanto aos meus-meus, fico pensando se valem a pena, aí descubro uma leitora aqui, alguém que postou um poema meu lá, as visitas aos meus blogs de poesia (com mais acessos do que eu poderia imaginar), e os novos livros que quero fazer que ainda não fiz ou não terminei. Tudo dá um trabalho imenso e às vezes vou dormir tarde por conta disso, porque não durmo enquanto não termino. Fora o que não é poesia e que também precisa ser feito, como a biografia do meu tataravô e o livro sobre minha avó, e outro que me pediram sobre Marco Polo (não o de poemas, a história mesmo), e há outros ainda fervendo, sendo cozidos no fogão permanente da imaginação. Um dia, saltam para fora. Fora as inúmeras traduções que ainda poderei começar e que não sentei para fazer. E o romance epistolar do meu pai (descobri novas cartas que estão sendo digitadas) que promete. Vai ser o único romance que irei escrever, porque não dou para isso. Meu lado poético me diz que não consigo escrever tanto. Mas nunca se sabe.

10/03/2018 - 10h30


sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Retas oblíquas, de Roberta Lahmeyer

TUDO começa aqui. A divisão do neoconcreto constrói a luz do poema. Traçamos uma reta ascendente em direção às palavras. As palavras escutam e tudo é poesia. “Me permita ser um pouco abstrata”, diz Roberta Lahmeyer, porque de concreta basta a vida. “A arte existe porque a vida não basta”, disse Ferreira Gullar. Por causa dos poetas, descobrimos planos ainda não visitados por aqueles que vivem sem poesia no seu dia a dia.

Olhar faz parte da descoberta poética, transpor para a palavra tudo o que é estranho. Escrevemos para descobrir. Não para dizer. Escrevemos para descrever a órbita do planeta. Tudo é oval, senoide, eclipsar. Roberta olha de novo e desvê. A mesma forma serve para todos os tecidos: “...a poesia atravessa a matéria e ilumina certos subterrâneos”. Entendi porque li, li porque vi, vi porque encontrei, encontrei porque busquei. Os olhos estão no presente e no futuro, a poeta espera o céu descer sobre sua cabeça “a dez centímetros”.

TUDO em poesia tem que ser uma descoberta. Como ler pela primeira vez. Como ver pela primeira vez num poema algo que não estava lá, mas está em alguma parte do ser. Dizer, redizer, desdizer, subentender o possível. Caminhamos. Caminhamos para nos tornar. Seremos o que nos transformamos. Todo livro de poesia é um jardim concreto de “pensamentos abstratos”. Observamos o essencial (invisível para os olhos). Só se vê bem com poesia. Retas e sombras oblíquas. Desvãos.

Poesia é exílio. É partida e chegada. Ver. Subverter. Onde o Eu míngua, há Você. Onde há corpos, há estar. O tempo gera a espera. Somos hoje o que há muito buscávamos ser. A luz que irradia da poesia ilumina o desfiar de palavras que se perfilam ao longo do livro em linhas oblíquas. Não só as palavras se suspendem como voltam ao ponto de partida. As palavras vão e voltam. A poesia vai e volta e se esconde no pensamento de onde não sai mais.

Thereza Christina Rocque da Motta, poeta, tradutora e editora, Membro da Academia Brasileira de Poesia e do Pen Clube do Brasil  



quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Livros impressos x e-books

Temos de fazer e-books e vender só e-books daqui a pouco, porque o custo de impressão está estratosférico. A Amazon previu isso há muito tempo. Quem gosta de livro em papel, vai tê-lo ainda por algum tempo, depois vai voltar a ser artigo de luxo, como era na Idade Média. Seria ótimo fazer novamente livros com iluminuras, à mão. Mas a Xerox inventou o livro digital que imprime por demanda. Estocar para vender não é a chave para o sucesso e, sim, imprimir o que foi vendido. Jeff Bezos faz isso na Amazon. O esquema é híbrido ainda, meio papel, meio digital. Vai nos custar muito para conseguirmos digitalizar tudo, mas já somos meio digitais. Um apagão vai sumir com tudo. Igual ao vídeo que recebi pelo zap. A quarta revolução industrial, a da era digital. Já imaginou ser diagnosticado por um robô e ter um advogado virtual que nem o atendente da Net? Com 60.000 homícidios no Brasil, mais do que todo o resto do mundo somado é para se perguntar o que será de nós.

1/02/2018 - 11h09